Da capacidade de indignar-se para evoluir humanitariamente
“Da vida quero tudo que puder levar”! Assim começa uma ótima aula que assisti a pouco do filósofo de rua, Eduardo Marinho. Na verdade ele não se considera filósofo, tampouco professor, mas apenas um artista de rua, um sujeito absurdamente indignado e inconformado com as disparidades e os abismos sociais que separam os brasileiros. Realidades diferentes em um mesmo bairro, miséria e luxos ocupando os mesmos espaços, porém completamente heterogêneos.
Para quem não o conhece Eduardo Marinho deixou de viver no seio de uma família classe média alta e abastada do Rio de Janeiro e se embrenhou nas ruelas e favelas e periferias. Um homem inconformado com todos os confortos e facilidades que o dinheiro lhe trazia. Sentia-se culpado,
sua consciência lhe cobrava o preço da exploração de mão de obra barata e assalariada, aqueles que serviam sua família e sujeitavam-se à subserviência em troca disso ganhavam falta de respeito, os poderosos e delirantes egos inflados, a abjeta supremacia racial estrutural e claro, como toda elite brasileira biscoito fino que se preze, um salário miserável.
Eduardo é um artista de rua, pintor de quadros com frases de efeito e reflexivas, tenta fazer as pessoas pensarem mais em viver, desenvolver sentimentos de afetividade, compromissos sociais, culturais, artísticos, enfim, fazer coisas que de fato lhes agradam e não se venderem tanto a
correria de um trabalho desgastante e empreendidos no acúmulo de bens materiais e riquezas, afinal a vida é uma passagem, ninguém sabe o que vem depois, mas certamente não levaremos nada de coisas materiais, então a impressão mais provável de continuação é a evolução da condição humana, sua capacidade de indignação, para tentar não ser tão seletivo e para também ouvir e não tão somente falar. Talvez espiritual, uma evolução de conceitos abstratos e pouco conhecidos, procurar entender quais as dificuldades que passam os desfavorecidos.
Nestes tempos de negligências sociais, estão nos vendendo uma grande quantidade de supérfluos, estão nos fazendo correr atrás de vencer na vida, disputar, chegar antes de todo mundo. Querem nos vender o consumismo desenfreado e a certeza de dever cumprido ao final da vida. É uma loucura, por isso a sociedade mundial adoece. Vejam alguns dos livros mais vendidos no mundo: O homem mais rico da Babilônia, Pai rico pai pobre, Mais esperto que o diabo, Os segredos de uma mente milionária Capitalismo como religião… e por aí vai.
Compactuo muito com as ideias do filósofo das ruas. Gosto de pensar no desenvolvimento do ser humano e nas qualidades em potencial de cada pessoa. Possivelmente uma pessoa que desprende a fazer da sua vida uma coleção de riquezas, chegará no fim do seu tempo e se arrependerá,
porque deixou pessoas de lado, deixou de se divertir, deixou de conhecer lugares e desfrutar esses momentos, deixou em branco páginas inteiras de sua vida que jamais serão preenchidas com um cartão de crédito.
Não teremos uma segunda oportunidade de viver aqui, quem sabe nem de rever aqueles que já deixaram este plano. Portanto é interessante refletirmos sobre o que buscamos e a maneira como levamos nossa vida. Longe de mim passar por “coaching” ou lembrar um escritor de livros de
autoajuda (tenho alergia a isso), meu pensamento é mais crítico, refere-se a nossa capacidade de cooperar mais enquanto gente. Tentar diminuir os abismos sociais, ajudar quem passa fome, os desabrigados, lutar por educação de qualidade para todas as crianças, enfim, tantos assuntos
urgentes que precisam de ação conjunta, de participação coletiva.
Nessa época muitas ações solidárias e mobilizações acontecem, precisamos ser constantes e empenhados nesses dramas sociais. O Brasil é o país com maior concentração de renda e riqueza do mundo, obviamente a miséria não é um acaso por aqui, mas é sim, parte de um sistema estruturalizado e dependente dessa miséria para continuar sendo rentável. “É por poucos terem tanto, que tantos tem tão pouco”! (MARINHO, Eduardo).