Coluna Políticas Públicas e Sociais: Da fé das pessoas e suas seletividades

Quando meu estimado amigo Jones, criador deste alteroso jornal, (gosto de adjetivar com devidos méritos tudo referente à cultura), convidou-me para fazer parte da equipe, aceitei de imediato, sem pestanejar, pois a leitura e a escrita fazem parte da minha essência, além do que estudo para ser um
historiador, logo refletir através de leituras e produção de textos significa transformar a profissão em efetiva realidade.
No entanto, a partir do convite, veio ao encontro um assunto que, confesso, tenho procrastinado para falar. A religião. Com toda certeza é um assunto muito pertinente e delicado, ao passo que a responsabilidade atrelada ao espaço no qual escrevo é de singular importância, pois não existe
política pública e social sem religião.
Talvez não tenha relevância, mas eu não sou religioso, e imediatamente afirmo aqui, meu intento jamais será menosprezar a fé das pessoas, pelo contrário, acho louvável. Minha reflexão de religião é entendida em ações. Explico: São as atitudes, aquilo que se faz pra ajudar quem estiver passando
por necessidades. Veja, pessoas em situação de rua necessitam de cobertores para se aquecerem e não padecerem de hipotermia. Precisam de uma refeição, ao menos uma, para que não desfaleçam de fome. Mas não é apenas isso e, caso você tenha essa atitude, parabéns, é edificante. Todavia
estou falando de justiça social. É nosso dever enquanto sociedade lutar pelo direito dessas pessoas de terem um lugar, onde possam manter-se com dignidade, é o mínimo esperado, ninguém merece viver sob tamanhas condições de distinção e inferioridade, é cruel. Nós precisamos enquanto
sociedade colocar a mão na massa e ajudar, precisamos combater os males que assolam e sujeitam tantos e tantos a condições desumanas em suas vidas.
Onde está nossa humanidade? Perdemos a capacidade de nos comover, olhamos tudo com olhos críticos, queremos saber o que aconteceu com aquela pessoa para ela acabar na rua e em seguida julgarmos necessária essa ajuda ou se o sujeito é um vitimista, é como se estivéssemos no tribunal
de Haia. Aliás, o vitimismo de forma acusatória é ótimo pretexto e muito usado para negar ajuda.
Nunca serei crítico da fé das pessoas, tampouco do Deus adorado por elas, mas serei ferrenho crítico dessa humanidade seletiva e da falta de ação que essa mesma fé empreende na vida das pessoas, tornando-as reféns de suas obrigações humanitárias, justamente por serem atuantes de
religiões ditas apegadas ao amor de seu próximo e em suas orações desejarem, hipocritamente, que um milagre mude o destino de uma criança abandonada na rua, isso é um escárnio! Gostaria de lembrá-los, a guerra não ocorre somente na Ucrânia branca e europeia, aqui nós também temos
uma, é a guerra do abismo social, de seres HUMANOS abandonados e famintos, vivendo como ratos de porão.
Outro exemplo de pouca ajuda e humanidade, parte do abandono de animais, são incontáveis, cães com sede e fome, feridos, mutilados, inclusive em nossa cidade temos um projeto para atendê-los, o
Segunda Chance, sobre ajuda recebida? Pouquíssima, apenas da galera envolvida. Críticas e dissabores? Sirvam-se.
Até onde conheço e li, a Bíblia é um livro primoroso cheio de ações e obras executadas por um revolucionário, um homem que desafiou imperadores poderosos, expulsou do templo corruptos e corruptores, lutou por direitos dos desprestigiados, pela inclusão, por melhores condições de vida
aos pobres, pregou o respeito a todas as criaturas, enfim, ele ensinou realizando obras, mostrou o caminho e esse caminho é tortuoso, é um lugar para andarmos juntos, para nos ajudarmos e crescermos, evoluirmos como seres melhores. Que fé é essa? O Deus daqueles e daquelas que
acreditam não deve estar acima de ninguém e sim no meio de todos, você dificilmente irá achá-lo na Igreja, porque ele atua para mudar, para melhorar a vida das pessoas. E, às vezes, está na pele de um mendigo, dividindo um pedaço de pão e um papelão com seu cachorro, ou sendo espancado, torturado, queimado vivo por algum cidadão de bem, que em seu nome e com uma camiseta do Brasil se torna o pior imbecil nessa sociedade doente.

Colunista Social-Everton Vila